junho 22, 2017

Dois loucos da Cuca

© Olle Carlson

ando numa fase de guardar todos os pedaços de riqueza que encontro. felizmente nem tudo é físico. este espaço é dedicado a loucuras que enchem a alma e o coração... este meu sentir deve estar relacionado com a estação do ano. Não posso não guardar as mágicas palavras que a Cuca, a Pirata disparou do seu galeão, e que certamente todos leram.


Dois loucos

Quando a guerra chegou e as gentes partiram com a triste roupa no corpo, quando os pianos e os lustres e os espelhos foram abandonados ao pó e ao saque, quando os invasores encheram as ruas e acenderam fogueiras no soalho das salas, quando as colunas de fumo afugentaram as últimas aves, quando as bombas destruíram todos os muros e o sol foi oculto por milhões de partículas de caos, sobraram, ainda, uns metros de jardim de laranjeiras no cimo do monte.
E nós permanecemos deitados, na imobilidade eterna de uma cama de baloiço de seda branca, sob a sombra das duas ou três árvores sobejantes, distraídos do ruído dos homens pelas notas de jazz, concentrados na métrica do.poema de fim de tarde, alheados da destruição pela beleza das asas de uma borboleta, protegidos do horror pela incapacidade de o representarmos.
E enquanto a guerra nos lambia os pés, espantava-nos o assombro dessa aurora lilás que sonhávamos ter nascido apenas para nós.
Foi assim que nos tornámos imortais.

de Cuca, a Pirata





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